Parando para um cafézinho

A história de uma suposta máfia

 

    Aksel sabia que não seria fácil. Mas ele não desistiria. Ele se esforçaria ao máximo até o fim do prazo de uma semana para conseguir um grupo. Foi o que ele pensou quando deixou o prédio da D.J.L..Mas...
    Era mais difícil do que ele pensava. As pessoas não andam por aí com cartazes dizendo "Eu canto bem" ou "Eu sei dançar". Elas também não saem cantando por aí como se a vida fosse um musical. E ele não podia sair perguntando para cada um que encontrasse se eles gostariam de fazer parte de um grupo junto com ele para salvar uma gravadora à beira da falência. Ele descobriu que isso não daria certo da pior forma possível: tentando.
    Depois de uma longa manhã de buscas e tentativas fracassadas, Aksel decidiu parar para comer alguma coisa e rever sua estratégia. Ele resolveu parar no estabelecimento mais próximo, uma doceria e café de nome "Lovely Chain".
    Assim que entrou, ele se arrependeu. Seus olhos quase arderam ao ver a quantidade de rosa que havia lá dentro. Além disso, ele logo percebeu que era o único cliente do o masculino que conseguia ver. 
    Aksel foi recebido por um atendente que vestia um terno e tinha a maior pose de galã. 
    -- Seja bem-vindo, mestre. Permita-me conduzi-lo à sua mesa. -- ele disse, segurando a mão de Aksel com delicadeza e levando-no ao salão principal do café e mostrando a ele uma mesa ricamente decorada.
    Aksel se sentou, e logo percebeu que as outras clientes do café olhavam para ele. Algumas até tentavam disfarçar uma risadinha. O jovem suspirou. "Bem, já que eu estou aqui mesmo...", ele pensou, antes de abrir o cardápio e fazer seu pedido.
    Enquanto esperava por seu "Love Puding", acompanhado de um "Sweetheart Chocolate" para beber, o jovem ficou observando o ambiente e as pessoas a seu redor. Esse era um hábito que ele sempre teve, desde pequeno. Alguns atendentes conversavam com as clientes, que davam risadinhas e cochichavam umas para as outras. Outros vinham da cozinha com bandejas cheias de doces, bolos e chás, servidos em louças de porcelana decorada. 
    Então, apareceu um funcionário que se destacava dos outros. Ele era ruivo e alto, seus braços fortes apareciam sob a manga curta de sua camisa e tudo indicava que o resto do corpo era assim também. Seus olhos azuis chamavam a atenção de qualquer um mesmo vistos de longe. Ele carregava apoiada na mão direita uma bandeja sobre a qual havia um bolo de três camadas com glacê rosa e branco. Ele não parecia estar tocando o chão. Aksel demorou um pouco para perceber que era porque ele estava usando patins.
    O funcionário deu um giro e ao mesmo tempo soltou a bandeja no ar e rapidamente a passou para a outra mão. O bolo se moveu apenas um pouquinho para o lado. Depois, o rapaz curvou-se levemente e colocou a bandeja sobre uma mesa, onde três garotas de idades variadas aplaudiram.  A expressão dele, que até então era séria e concentrada, mudou para um sorriso sincero. 
    Todos os clientes do café, incluindo Aksel, observaram a cena impressionados. O funcionário fez algumas reverências e voltou para a cozinha. 
    "É de alguém assim que eu precisava", pensou Aksel. "Bonito, talentoso... Se souber cantar, é o candidato perfeito".
    O aprendiz só precisava de uma chance de conversar com aquele atendente. Infelizmente, aquele não era o lugar mais adequado. Aksel não tinha tempo a perder, ele precisava dessa chance logo. Situações desesperadas exigem medidas desesperadas. Por isso, o jovem decidiu se levantar e fazer uma pequena pré-investigação na mesa ao lado.
    -- Olá, senhoritas. Será que eu posso me sentar aqui com vocês?
    As meninas da mesa, quatro que pareciam ter a mesma idade de Aksel e uma mais nova, deram uma risadinha e o deixaram se sentar. Uma das mais velhas cochichou para outra, sem que Aksel pudesse ouvir:
    -- Que desperdício... Ele é uma gracinha...
    -- São sempre os mais bonitos... -- a outra respondeu.
    A garota mais nova, que não parecia ter mais do que sete anos, não foi tão discreta: 
    -- Você gosta de meninos, moço?
    O rosto de Aksel ficou vermelho ao ouvir a pergunta, o motivo para ele ter ido àquele lugar não tinha nada a ver com aquilo. Mas ele não conseguiu dizer nada, sempre ficava incrivelmente nervoso perto de garotas.
    -- Ei, você não deveria falar uma coisa dessas! -- outra garota a repreendeu. -- Peço desculpas pela minha irmã. Você não precisa contar sobre assuntos tão pessoais para a gente. -- ela continuou, virando-se para Aksel.
    -- N-na verdade.... -- ele respondeu, tentando esconder o nervosismo (e falhando) -- Não tem problema...
    As garotas interpretaram o nervosismo dele como confirmação de suas suspeitas. 
    Depois de um tempo de silêncio e vários biscoitos, Aksel resolveu ir ao assunto que o havia levado até lá:
    -- S-sabe... Essa é a primeira vez que eu venho aqui e... Tem umas coisas que eu queria saber...
    -- Mesmo? Não seja tímido, pode perguntar!
    -- Nós responderemos todas as suas perguntas!
    -- Ééé... É sobre aquele garçom que estava aqui mais cedo...
    -- O Soren? Aquele ruivo bonitão que trouxe o bolo?
    -- Esse mesmo. -- confirmou Aksel. 
    -- Ele é incrível, não é? Começou a trabalhar aqui há pouco tempo. E faz um número de dança maravilhoso.
    -- Número de dança? -- ele perguntou, interessado. "É melhor do que eu imaginava...."
    -- Você está com sorte. Vai começar daqui a alguns minutos. Nós todas viemos aqui para vê-lo, na verdade.
    "A sorte realmente está do meu lado", Aksel pensou, sorrindo.
    Enquanto isso, Soren Intet, o funcionário, se preparava para a apresentação, sem ter noção do tanto de atenção que estava atraindo. Tanto positiva quanto negativa. Desde o primeiro dia trabalhando no Lovely Chain, ele arrancava suspiros das clientes com seu número de dança. Aliás, foi graças a essa sua habilidade que ele foi contratado para trabalhar lá. Ele conseguiu até mesmo chamar a atenção da gerente de lá, tornando-se seu "queridinho". 
    Isso gerou muita inveja nos outros funcionários.
    -- Quem esse aí tá pensando que é? Mal chegou e já está querendo tudo.
    -- Esse tipo de pessoa é o pior.
    -- Ele devia se dar conta de que aqui não é o lugar dele.
    Esse tipo de diálogo maldoso continuou por vários dias, até que um deles comentou:
    -- Se ele não se toca sozinho, então nós deveríamos dar um "empurrãozinho" a ele.
    Voltando a Aksel, que agora estava sem saber o que dizer enquanto a meninas falavam sobre... coisas de meninas. Ele ficou apenas olhando para a tela do celular, praticamente contando os segundos para a apresentação de Soren, até perceber que elas tocaram num assunto que ele conhecia bem.
    -- Vocês ficaram sabendo sobre o hiato do [A]?
    -- O quê?
    -- Como assim?
    Sem pensar, Aksel disse:
    -- Eles já anunciaram?
    As garotas ficaram surpresas.
    -- Como assim? Não teríamos como saber se não tivessem anunciado.
    -- Ah, é só que... sabe como é, eu vi uma notícia na internet... Achei que fosse só um boato ou uma brincadeira de mal gosto. -- ele tentou disfarçar.
    Felizmente para Aksel, antes que elas pudessem perguntar mais, um funcionário apareceu para anunciar que a apresentação de dança ia começar.
    As luzes principais se apagaram, e em meio à pouca iluminação, um dos garçons pegou um microfone, e uma música romântica começou a tocar.
Minha princesa
Seu sorriso brilha como as estrelas
Seu olhar me deixa sem fala
Você é
A pessoa mais bonita que existe
Mais perfeita do que a imaginação poderia criar
 
    Era óbvio que ele estava apenas dublando, mas isso não impedia várias garotas de aplaudirem.
    "Você nunca chegará ao meu nível, Intet!", o "cantor" pensou. "Até porque o seu tempo aqui acabou."
    Logo após o último verso, a música mudou para uma mais agitada e Soren apareceu. Ele caminhou até o centro e começou a dançar. Ele executava os passos com uma precisão admirável, e sua expressão era muito séria. Era clara a sua concentração, mas um olhar mais atento revelaria que ele também estava se divertindo. Afinal, Soren estava fazendo o que mais amava.
    No entanto, quando o número estava perto do fim, aconteceu uma coisa pela qual ele não esperava: uma poça de leite. Ninguém viu, e quem viu fingiu que não, quando um outro funcionário "acidentalmente" despejou uma jarra inteira no chão, bem no lugar da apresentação. Soren estava concentrado demais em sua dança para perceber, e só se deu conta do perigo quando pisou na poça e escorregou, caindo em uma mesa, enfiando os cotovelos com tudo em um bolo de aniversário. Por uma incrível "coincidência",  era o bolo de aniversário da pequena Soile, filha mais nova do político Kunz Olander, que comemorava seus três anos com a irmã mais velha Benya, várias amiguinhas e algumas babás. 
    A pequena, é claro, ficou assustada e logo começou a chorar. E em um grupo de crianças pequenas, choro é algo que se espalha rápido. Logo, cerca de dez menininhas estavam chorando muito alto enquanto as babás tentavam acalmá-las. Soren se levantou e começou a pedir desculpas, mas acabou escorregando novamente no leite, dessa vez caindo no chão. Benya Olander, irritada com o choro, se levantou e foi até ele:
    -- Seu boboca! Olha o que você fez! Arruinou a festa da minha irmã!
    Soren voltou a se desculpar, mas ele sempre falava baixo e Benya sempre gritava. O tom autoritário da menina, que tinha doze anos fez com que ele baixasse ainda mais o tom de voz. 
    Um pouco afastados dali, os outros funcionários observavam a cena tentando conter as risadas. O plano havia funcionado, ninguém os havia visto, e a confusão estava armada. Mesmo que Soren conseguisse sair dessa, eles só precisariam fazer aquilo de novo e de novo até que ele perdesse o emprego.
    Ninguém os havia visto... com exceção do jovem aprendiz da D.J.L.. Aksel ficou revoltado com a sabotagem que havia presenciado, e ainda mais vendo como a jovem patricinha não parava de brigar com Soren, que não teve culpa de nada. 
    Os gritos de Benya foram ficando mais altos. Ninguém tentava pará-la. Soren já nem tentava mais se defender, apenas olhava envergonhado para baixo, só desejando que aquilo acabasse logo. Ele nem havia se levantado do chão.
    Então, entrou no salão uma mulher muito elegante. Não era possível nem estimar sua idade. A maioria das clientes nunca a haviam visto, mas todos os funcionários a conheciam bem. A gerente do Lovely Chain.
    -- Mas o que é que está havendo aqui?! -- ela gritou, em um sotaque de um lugar muito, muito distante.
    Benya parou de gritar. As outras clientes pararam de fofocar em cochichos. Alguém se lembrou de parar a música. Até as crianças pararam de chorar.
    -- Ninguém vai me explicar o que significa isso?
    -- Esse boboca acabou com a nossa festa! -- Benya foi a primeira a dizer. -- Como podem ter um funcionário tão "desbroncolhado"?
    -- Um funcionário o quê? -- perguntou a gerente.
    -- "Desbroncolhado". Ele não faz nada direito. Eu e a Soile vamos contar tudo pro papai!
    -- Espere, espere. Tenho certeza de que há uma explicação. 
    -- Explicação? Olha isso! Ele destruiu nosso bolo! E ao invés de se desculpar, resolveu sentar aí no chão! Ele é o maior "desbroncolhado"!
    -- Isto é verdade, Soren? Você destruiu o bolo dessas adoráveis pestinhas, digo, garotinhas?
    --.... Sim, senhora.
    -- Estou decepcionada com você.
    -- Peço desculpas.
    -- Você vai demitir ele, né? -- perguntou Benya.
    -- D-demitir?
    -- Claro! Ele acabou com a festa! Lugar de bobocas é na rua!
    Soren olhou para a gerente, esperando que ela não o demitisse. Se ele perdesse o emprego, estava perdido. Porém, não tinha coragem de dizer isso a ela, já que se considerava responsável pelo ocorrido.
    -- Parece que não tem jeito... Soren Intet, você está despedido. Passe na minha sala para acertar tudo. -- concluiu a gerente, sem ânimo. -- Peço desculpas por tudo isso. Todas terão um desconto em suas contas, e ainda ganharão biscoitos de graça!
    Com isso, o assunto se encerrou. Soren se levantou, e com uma expressão de derrota acompanhou a gerente até sua sala. Os outros funcionários comemoravam em silêncio, sem perceber que Aksel os observava.
    "Droga! Assim que ele sair daqui, eu não terei mais como vê-lo! Eu preciso falar com ele agora!"
    -- Está tudo bem, Aksinho? -- perguntou uma das garotas que estava com ele. 
    -- Se eu der a volta pelo lado de fora, posso achar a entrada de serviço...-- ele murmurou, mais para si mesmo.
    -- Aksinho?
    -- É isso! -- ele exclamou, se levantando. -- Eu preciso ir, foi um prazer conhecê-las. -- ele jogou algumas notas na mesa, para pagar pelo que tinha comido, e saiu correndo, procurando a entrada de serviço.
    As meninas ficaram apenas olhando.
    -- Começa a corrida pelo amor! -- uma delas anunciou.
    Enquanto isso, Soren estava no vestiário dos funcionários pela última vez, trocando o uniforme por roupas comuns. Ele guardou suas coisas em uma mochila, e antes de sair pegou o celular e olhou para a tela. O wallpaper era uma foto tirada em uma cidade pequena, na frente de uma casa que a essa hora já devia ter sido demolida. No centro da foto, havia um casal orgulhoso e, entre eles, o motivo de seu orgulho: um rapaz, filho deles, que havia conseguido passar na prova de seleção de uma prestigiada academia de dança. Eles não se opuseram quando o filho quis seguir seu sonho, em vez de buscar por uma carreira mais tradicional e segura. As coisas nunca foram fáceis para essa família, financeiramente falando, mas o casal não se importou em ter que trabalhar dobrado, triplicado para pagar a cara mensalidade para o filho. Mas tudo mudou quando aquela doença os levou. Vendo-se sozinho, o rapaz foi obrigado a largar os estudos e a procurar um emprego para poder se sustentar. 
    Soren estava sozinho, e muito longe de realizar seu sonho. Do jeito que as coisas estavam, seria impossível que ele algum dia pudesse voltar à academia, a não ser que acontecesse um milagre. 
    Ele não percebeu na hora, mas o milagre veio, na forma de um jovem loiro suado e cansado por ter dado quase uma volta inteira no quarteirão à procura da entrada de serviço. Aksel conseguiu chegar lá no exato momento em que Soren estava saindo. 
    -- Espere! -- ele exclamou, quase sem fôlego. -- Eu preciso.... falar com você... por favor, espere!
    Soren olhou surpreso e um tanto preocupado para ele. 
    -- Está tudo bem? 
    -- Está... E vai ficar ainda melhor se você me ouvir. -- disse Aksel, já recuperado da caminhada.
    -- Desculpe, mas... nos conhecemos? -- perguntou Soren.
    Aksel não tinha certeza de qual seria o melhor jeito de contar a ele. Mas aquela podia ser sua única chance. Ele resolveu simplesmente dizer tudo de uma vez:
    -- Não. Mas eu vi você lá no Lovely Chain e... nossa, você é incrível! Aquela sua dança foi sensacional! Por isso, eu tenho que dizer: eu preciso de você!
    A escolha de palavras feita por Aksel deixou Soren um pouco assustado.
    -- P-pr-precisa? M-mas nós mal nos conhecemos e.... Além disso, eu... Bem, eu...
    -- Por favor! Eu tenho só uma semana!
    -- Hein?
    -- Hein?
    Os dois ficaram se olhando por alguns segundos de silêncio constrangedor.
    -- Para que exatamente você precisa de mim? -- perguntou Soren.
    -- Você conhece a D.J.L.? A gravadora, do [A] e companhia?
    -- A que está falindo?
    -- Er... Isso é golpe de marketing... -- respondeu Aksel, inventando na hora.
    -- Oh... Interessante...
    -- Bem, eu trabalho nessa gravadora e... Estamos com um... projeto novo, sabe... Me deram uma semana para montar o grupo do qual eu serei um integrante. E... eu queria convidar você para fazer parte dele. 
    Soren nem parou para pensar, sua resposta foi imediata:
    -- Não, obrigado.
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multishipper_sheep
Tem alguém lendo? Essa história tem mais de 100 views e só um subscriber (minha irmã). Se você leu, mesmo que só o comecinho, deixe um comentário, please? :3

Comments

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Mila2410 #1
Uuuhuuu! Update!
Mila2410 #2
Oiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii