Notas Perdidas - A mais

Notas Perdidas

Narrador

 

Sara estava desejosa de chegar a casa. Só queria voltar para o aconchego da sua cama.

Ao ver a sua boleia chegar, seguiu o rapaz que a acompanharia até casa, ainda se perguntando porque estaria a confiar nele, ou porque é que o seu pai a confiaria a sua filha a um completo estranho.

Entrando no transporte que a levaria até casa, o homem ao volante pediu-lhe para passar o cartão no visor a seu lado. Sara estranhou, perguntando-se porque não lhe havia pedido o cartão nessa manhã na vinda para a escola. Ela não tinha cartão.

“Se não tem passe não pode subir.” o homem disse sem se dar ao trabalho de olhar para ela.

Vasculhando na sua carteira procurava algo que a pudesse ajudar, “dinheiro” pensou.

Ouvindo um “bip”, olhou para cima vendo o rapaz moreno passar a sua carteira pela máquina.

O condutor olhou para ela e assinalou para passar, indiferente.

Perplexa, Sara ficou a olhar para as costas do rapaz que continuava até ao fundo do bus e continuou, seguindo os seu passos.

Esperou que o rapaz moreno se sentasse, mas outra vez, ele ficou de pé, mantendo o equilíbrio sem qualquer esforço, segurando a argola suspensa acima da sua cabeça.

“Devia agradecer… provavelmente foi ele a pagar o meu passe desta manhã também.”.

Tomando acento no lugar vago ao seu lado, Sara olhava para ele sem saber como iniciar qualquer tipo de conversa, tentando raciocinar diferentes pensamentos ao mesmo tempo.

A atitude do Leo para com ela. Mas Leo parecia não gostar particularmente de ninguém. “Suponho que seja arrogante com toda a gente” pensou.
A atitude da Minah com Leo. Minah dava ar de ser uma rapariga alegre, e parecia ter algum tipo de interesse em Leo mas num momento tanto parecia essa rapariga como no seguinte se tornava fria e indiferente.

A atitude de Leo com Minah. Num momento a ignorava como no outro parecia incomodado com a atitude dela.
A atitude do rapaz moreno com Leo…
O rapaz moreno...

O seu olhar desviou-se do ponto que fixava vagamente para o perfil do rapaz ao seu lado, que, por sua vez fixava o telemóvel, completamente absorto.

Sara aclarou a voz no intento de chamar a sua atenção, mas sem resultados. Ele continuou focado no que lia.

Tomando uma golfada de ar ela olhou diretamente para ele e abriu a boca apenas para ser interrompida - “Jung Taekwon…” ele disse sem olhar para ela e fez uma breve pausa “...não te devias aproximar muito dele. Se queres ter um ano lectivo minimamente calmo.”

Sara fechou a boca e franziu o sobrolho, olhando para as suas mãos cerradas no seu colo.

“Sabes muito para quem não fala nada.” soltou quase inaudivelmente.
Sentia-se incomodada pelo facto de assumir coisas sem a conhecer minimamente.

 

O rapaz de pé ao seu lado soltou um riso abafado.

“Mas não te conheço assim tão bem, suponho que já sejas uma rapariga crescida e saibas fazer julgamentos por ti própria.” ele disse pressionando um botão no telemóvel e voltando a guarda-lo no bolso das calças do uniforme “Como foi o teu primeiro dia?” continuou enquanto procurava algo para lá das janelas do autocarro.

“Yongguk… certo?” ela respondeu, num tom frustrado, chamando a atenção do rapaz que agora olhava para ela. O olhar de Sara baixou da sua face para o casaco que Yongguk vestia. Procurava a sua placa “Yongguk?” ela insistiu esperando uma resposta, olhando-o de volta nos olhos.

Encarou-a por segundos e respondeu com um meio-sorriso. “Sim.Yongguk.” desviando rapidamente o olhar.

 

POV de Sara

 

Finalmente estava livre daquele uniforme, sentia-me mais leve enquanto caminhava para a cozinha nos meus calções e T-Shirt. Perguntava-me se estava demasiado habituada a este tipo de roupas relaxadas. A verdade é que tanto as usava em casa na minha privacidade como num dia de passeio.

Não me importava muito com isso enquanto me sentisse bem com o que vestia.

Preocupava-me mais com tentar esconder estes papos debaixo dos meus olhos. Ninguém precisava de saber que era constantemente socada pela vida.

Sorri ligeiramente ao olhar para a minha t-shirt favorita.

A imagem do rapaz moreno a sorrir surgiu na minha mente. Desde que ele me deixara à porta de casa que essa mesma imagem continuava a brincar com a minha mente.

Suspirei, ligeiramente irritada comigo mesma e subi para o meu quarto com um copo de leite na mão, a única razão pela qual tinha saído do meu quarto.

Parei no topo das escadas ao ouvir a porta de casa abrir. O meu pai chegara. E pelo som que se ouvia através do hall de entrada ele acabara de vir das compras. “Comida.” pensei descendo as escadas novamente, o mais rápido que conseguia.

“Não sabia o que comprar para o jantar mas achei mais apropriado fazer-se comida caseira.” ouvi a sua voz “O que achas? Tenho de te agradecer por me poupares neste primeiro dia de aulas, foi exaustivo.”

“Não quero falar de escola, acabei de sair de lá…” comecei num tom de brincadeira, mas o meu sorriso desaparecendo ao ouvir outra voz responder por mim.

“Não custou nada. A Sara não foi de nenhum incomodo.” soou uma voz grossa.

“Às vezes ela pode ser difícil de lidar.” continuou o meu pai enquanto eu entrava na cozinha para o encontrar a retirar as compras dos sacos com a ajuda de um rapaz, e colocando-as nos armários, “espero que tenhas paciência com ela.” ele gargalhou.

Yongguk olhou para mim a partir do outro lado da cozinha e com uma expressão indecifrável, e respondeu calmamente ao meu pai

“Depende de como ela se portar ao meu lado.”

 

POV de Yongguk

 

“...às vezes ela pode ser difícil de lidar. Espero que tenhas paciência com ela.”

Sara entrou na cozinha no momento em que eu e o Sr. Choi começamos a arrumar as compras. E pela expressão que carregava, algo não a deixara muito feliz.

Algo… Ou alguém. Eu.

Olhou para mim com um ar carregado e encostou-se ao balcão de mármore, no lado oposto da cozinha, ficando frente a frente comigo. Ainda que a distância entre nós fosse significativa, a onda de desconforto que ela irradiava era palpável.

O facto de eu estar aqui incomodava-a.

Olhei para o seu pai, que se encontrava concentrado na arrumação e olhei-a novamente por breves momentos antes de responder.

“Depende de como ela se portar ao meu lado.” disse num tom sério.

Fez-se silêncio por momentos e a cara antes séria de Sara ficou sem expressão por segundos, até se tornar num franzir de sobrolho. Tinha-a irritado.

Soltei uma gargalhada seca e o Sr. Choi rapidamente me seguiu, para desagrado de Sara.

Fez um esgar e pousou um copo de leite que segurava, na ilha de mármore que nos separava.

“Oh! Sara!” exclamou o seu pai, agora reparando na sua presença. “Ainda bem que estamos aqui todos…” começou, aproximando-se do fogão. “Estava a pensar…”

“Não tenho fome.” Ela interrompeu o discurso e voltou-se para sair de novo. Observei a sua imagem, agora em roupas mais relaxadas, e sorri. Ainda que o seu comportamento fosse infantil, não contive uma gargalhada escondida.

“Sara…” continuou o seu pai, “Não nos vais contar como foi o teu dia? Aconteceu algo interessante?”

O meu olhar seguia o sentido da conversa, como se de um jogo se tratasse. “Queres que te conte? Okay. A partir de amanhã poderia andar sem guarda-costas. Mas não tenho passe para o autocarro.” ela respondeu friamente.

O seu pai suspirou, desistindo. “Vou falar com a direção da escola e tratarei disso amanhã. Podemos jantar?”

Sara cruzou os braços sobre o peito e olhou-me de alto a baixo.

Encostei-me à bancada atrás de mim, estranhamente divertido, e cruzei os braços também, devolvendo-lhe o mesmo olhar.

Sara podia ter crescido e parecer uma mulher. Mas continuava a mesma criança de há anos atrás.

“Estou a perder alguma coisa?” interrompeu o Sr. Choi. " Sinto o ambiente ligeiramente pesado… não sei o que se passa mas é bom que se resolvam. Já não são duas crianças." suspirou levando os seus óculos à camisa que usava, esfregando-os na mesma e voltando a ajeita-los na cara.

Os meus olhos desceram para o chão num ato involuntário de embaraço. Era como se ainda tivesse 7 anos.

“Incrível como ela me transformou numa criança em menos de dois minutos. ” pensei, olhando de relance para Sara, sentindo-me envergonhado pela minha atitude.

“Já se faz tarde, se calhar é melhor eu voltar para os dormitórios.”

Desculpei-me educadamente, rejeitando o convite para jantar e caminhei para a paragem de autocarros.

Ajeitei o gorro e enrolei o cachecol à volta do meu pescoço.

Ainda me esperava uma noite no estúdio.

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CaesarCristina
Hi Hii! I'd love to read your opinions on my story, so don't forget to leave you comments!

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